sexta-feira, setembro 03, 2010

ORIXÁ DAS PALAVRAS

Foto: Mauro Ferreira
Por Ramon Mello

Ansiosos, os estudantes adolescentes aguardavam o início da pré-estreia de Bethânia e as Palavras, no Teatro Fashion Mall, no Rio de Janeiro. Alguns empunhavam cadernos com declarações de amor, outros levavam discos com fotos da cantora, muitos falavam alto, gargalhavam. Quando Maria Bethânia subiu ao palco, com os pés sempre descalços, o silêncio tomou conta do ambiente, para, em seguida, ser cortado por aplausos e gritos elogiosos.

Bethânia, mãos ao alto, óculos no rosto, longe do microfone, no centro do palco, canta, à capela, com sua voz híbrida, um trecho de música em reverência a Iansã, deusa africana dos ventos e das tempestades. O público torna a ficar em silêncio, aguardando o próximo gesto da cantora, que, de tão imponente, lembra o próprio orixá de que é devota. Tomando o microfone, a intérprete abre o espetáculo assumindo seu amor pela palavra falada, confessando a alegria e a surpresa de estar no teatro para fazer leitura de textos.

Mesclando canções, Bethânia lê dramaticamente, acompanhada do violonista Luiz Brasil (que, por esquecer de tocar o violão durante a leitura de alguns poemas, levou uma bronca da cantora) e do percussionista Carlos Cesar, de poetas e escritores que marcaram sua vida: Sophia de Mello Breyner Andersen, Cecilia Meireles, Clarice Lispector, Manuel Bandeira, Fausto Fawcett, Wally Salomão, Cacaso, Ferreira Gullar, Fernando Pessoa. "O palco é sempre lugar de aprender", afirma Bethânia, para em seguida cantarolar um trecho da música “O que é? O que é?”, de Gonzaguinha: "Viver! / E não ter a vergonha / De ser feliz ".

Apresentada às palavras pelo professor Nestor de Oliveira, mestre de sua cidade natal, Santo Amaro da Purificação, no interior da Bahia, Bethânia expõe sua intimidade com textos de escritores e poetas, principalmente com Fernando Pessoa - cuja reverência rendeu à Maricotinha a Ordem do Desassossego, da Casa Fernando Pessoa, em Portugal. “Mesmo estudando no recôncavo da Bahia, é possível se encantar com as palavras. É uma prova que é possível uma educação plena”, diz a cantora, que dedicou o espetáculo a suas mestras Teresa Aragão (ex-mulher de Ferreira Gullar) e Violeta Arraes. A intérprete também agradeceu aos alunos e professores presentes na plateia, entre eles Julio Diniz, diretor do departamento de Letras da PUC - Rio, seu amigo e colaborador.

O novo espetáculo de Maria Bethânia, criado em 2009 a partir de um convite da Universidade Federal de Minas Gerais para participar do ciclo de conferências Sentimentos do mundo, é uma declaração de amor à língua portuguesa.

Entre versos e canções, no palco, Maria Bethânia é um “orixá das palavras”.

>>> Maria Bethânia conversa com Leilane Neubarth (Globo News) sobre o espetáculo " Bethânia e as Palavras":




>>> Assista à entrevista exclusiva de Maria Bethânia ao SaraivaConteúdo:



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