quinta-feira, outubro 28, 2010

foto: Marcos Dantas

"deus te crie, poeta", Adélia Prado me disse

foto: J. Egberto

>>> para quem não ouviu o cbn na travessa com a adélia prado, AQUI!

REENCONTRANDO ADÉLIA


Adélia está ali na livraria "Travessa" do Leblon/Rio, num auditório apinhado de leitores atentos, respondendo perguntas durante o lançamento de "A duração do dia"(Record). Chegamos meio atrasados, Marina e eu, e ficamos em pé ouvindo. Linda essa Adélia, com esses cabelos brancos, aquele rosto maduro, falando sobre a alucinação que é escrever poesia.

De repente, ela quer citar aquele tradutor de Guimarães Rosa, o nome lhe escapa, eu sopro de onde estou: "Gunter Lorenz" . Ela nos reconhece, abre um sorriso familiar, acolhedor, e diz que recomendou que a uma repórter me perguntasse sobre aquela estória de como a ajudei na publicação de seu primeiro livro. Ela já está cansada de contar isto.

Realmente a repórter me havia telefonado minutos antes, e contei o que já virou folclore: não nos conhecíamos, mas Adélia me enviou seus poemas. Eu li aqueles textos, alguns manuscritos e fiquei maravilhado. Como quando a gente descobre uma pepita de ouro na bateia, ou uma nova estrela no firmamento, telefonei para Drummond e disse: -alvíssaras! surgiu uma poeta em Minas!

A gente sabe que isto não ocorre todo dia. Mineração poética é coisa árdua. E os astrônomos levam tempo para achar algo novo nos céus. E aquela era uma estrela, das grandes. Estava madura. Pronta. Tinha brilho ( ou redação própria).

Quis o destino (e a força de sua poesia) que nossos caminhos se cruzassem. Era eu crítico da "Veja" e resenhei seu primeiro livro ajudando a divulgá-lo além das montanhas. Na verdade, o lançamento do livro no Rio já tinha sido um acontecimento. Além do ex-presidente Juscelino aparecer na noite de autógrafos, também Rubem Braga a recebeu em sua cobertura. E Adélia ali, com sua simplicidade autêntica, imaginem! pedindo autógrafo das celebridades presentes. Ela que em Paraty, há pouco tempo, teve uma fila de 5 horas de leitores ansiando por seu autógrafo.

De outra feita, uma ex-aluna que trabalhava com Roberto Dávila instigou-o a entrevistar Adélia. Ele chamou-me para ajudá-lo. Ela falou aquelas simplicidades que extasiam todo mundo. Pois Fernanda Montenegro, que é mineira, se achou nas palavras dela e me telefonou pedindo para contatá-la. Surgiu então o espetáculo ""Dona Doida".

Aliás, essa estória engraçada: Ziraldo estava em Belo Horizonte no projeto "Encontro Marcado" e implorou a Arakén Távora:-Me leve a Divinópolis, tenho que conhecer Adélia. Ao que Arakén comentou: -Imagine, o Menino Maluquinho quer conhecer Dona Doida!

O que é que a poesia dessa mulher tem?

Leiam as dezenas de teses e não sei quantos ensaios sobre sua obra.

Mas tem algo mais. Agora ela está ali falando aos seus leitores. Diz que é necessário paciência e humildade para merecer um poema. Que um poema não é um artefato racional. Que a obra de arte é melhor que seus autores, pois fala de nossa densa humanidade. E o mistério continua.

Cássia Kiss e Ramon Mello lêem vários de seus poemas. E o mistério continua. Sua fala termina, nos abraçamos, tiramos retrato, forma-se a imensa fila, converso com José- o marido- singularíssima figura.

Vou para casa e leio os poemas, aumentando a duração do dia e da noite.

O artista é aquele que se dá o luxo de ouvir sua voz interior. Há ruídos demais no mundo e a poesia, quando autêntica, recupera nossos elos perdidos. Elos que nem sabíamos existir, mas que vão se compondo no fragmento das palavras até que de repente o sentido emerge.

E poesia é isto, revelação, epifania.

6 comentários:

Ramon Nunes Mello disse...

" "Deus te crie" após o espirro de alguém é uma herança judaica da frase Hayim Tovim, que pode ser traduzido como tenha uma boa vida."

Anônimo disse...

Cade vez mais bonito, hein! =P

A editora não enviou um exemplar de "Vinis Mofados" para a BN? Que coisa feia...
Abs

Ramon Nunes Mello disse...

sobre a BN não entendi...

Anônimo disse...

Oi Ramon.
Desculpe, é a nossa querida Biblioteca Nacional. Dizem que toda editora é "obrigada" a doar um exemplar ao acervo da casa. Não sei se é verdade. Pelo jeito não é...
Abraço.
Parabéns pelo trabalho.

Ramon Nunes Mello disse...

oi,
a editora é obrigada a fazer a doação sim. foi realizada. mas, creio, a catalogação não é imediata. por isso não deve ter encontrado...

obrigado, ramon.

ps: qual o seu nome?

Anônimo disse...

Oi.
Deve ser isso, então.
Mas já está comprado o livro.
Só falta o autógrafo...

Abraço.
Flavio Santos