sexta-feira, julho 22, 2011

TONO + NEY = TESÃO E INTENSIDADE

Ramon Mello

Ouvi um som psicodélico que primeiro chamou minha atenção pela mistura de uma voz feminina (cuja leveza e doçura, às vezes, pode remeter a Nara Leão ou Marisa Monte) com batuques, frevos, bossas, boleros e rocks sintetizados. Fiquei encantado com a sonoridade original do quinteto carioca chamado Tono: Ana Claudia Lomelino (voz e metalofone), Rafael Rocha (bateria e voz), Bem Gil (guitarra), Bruno di Lullo (baixo) e Leandro Floresta (flauta, teclados e sintetizadores). Isso foi em dezembro de 2008, se não me engano.

O primeiro show a que assisti foi no teatro Odisséia, tempo depois da minha alegria com a descoberta do CD. Ana Claudia Lomelino, no palco, me causou estranhamento. Uma mulher pequena, emoldurada em expressões corporais miúdas e figurino espalhafatoso, que entoa uma voz límpida. Uma boneca desarrumada de voz poderosa, pensei. Ela é cool, alguém disse na plateia. Não. Ela é a flor de delicadeza de um coletivo de meninos charmosos e musicais, uma grande cantora cuja sofisticação não se limita a uma palavra.

A identidade musical e estética do grupo passeia não só pelas influencias musicais, mas também por outras linguagens como o teatro, as artes plásticas, a fotografia e o cinema. As letras autorais tematizam o prazer, o amor, a alegria, tudo com um humor de quem ri de si próprio. A maior parte dos integrantes tem composições nos álbuns; escolhi os meus clássicos: “Me sara” (Rafael Rocha e Bernardo Palmeira), “Corte no pé” (parceria de Bem Gil e Barbara Ohana); “Ele me lê” (Ana Claudia Lomelino, feita a partir da troca de e-mails com Caetano Veloso), “Não consigo” (Rafael Rocha), "Quando Você Dança" (Rafael Rocha),"Misturo cores" (Rafael Rocha, Leandro Floresta, Silvia Machete) e “Sonhador Sonâmbulo” (Rafael Rocha) – o verso “invisto nas ações do prazer” traduz da melhor forma o jovem grupo.

Por que estou escrevendo esse texto? Ontem, dia 21 de julho de 2011, assisti ao show da ‘Tono + Ney’ minha admiração extrapolou os limites, precisei compartilhar a sensação. No Espaço Cultural Sérgio Porto, no Rio de Janeiro, Ney Matogrosso (vestido com uma jaqueta prateada) participou cantando canções do grupo: “Não consigo” (que será gravada por ele em novo álbum) e “Sonhador Sonâmbulo”. Além de “Assim Assado” (João Ricardo e Paulinho Mendonça), sucesso do Secos e Molhados, cantado por todos.

Ana Cláudia Lomelino e seus comparsas foram abençoados pelo maior intérprete da música brasileira. A transgressão de Ney se espalhou no palco e abraçou a delicadeza de Lomelino. Podia-se imaginar o frio na barriga da cantora, no canto do palco, diante do ídolo que se aproximava juntando as vozes em falsete. E, ainda, a voz de Bem e Rafael chegando aos dois, com a platéia em êxtase. Toda esta aura que pairou pelo Sérgio Porto era sentida em sorrisos e suspiros, abraços comovidos e uma vontade de prolongar aquele momento.

Emocionante testemunhar Ney Matogrosso, em plena forma prestes a fazer 70 anos, envolto de jovens que deliravam a cada interpretação. Em meio aos rebolados e agudos pude entender que Ney grava músicas de novos compositores por necessidade, e não por generosidade. É com tesão que ele sobe no palco e eterniza canções de novos compositores em sua voz.

Tono é sinônimo de intensidade. Pode ser ária, música alegre ou disposição, atitude. Faz sentido. A banda mais bonita da cidade, desculpe, é a Tono.


Um comentário:

Mauro disse...

Vi no Youtube dois vídeos desta apresentação, e certamente foi pura magia. A voz do Ney é simplesmente deslumbrante! Incrível que ela só tenha ganho nuances c/ o passar do tempo, 70 anos e a voz está lá, perfeita, jovem como nunca. Adoro Tono, a química c/ Ney foi perfeita, gostaria que ele gravasse mais canções da banda no seu próximo -e aguardado- cd. Abs.