sexta-feira, dezembro 25, 2009

VALE ATÉ MENTIR

Por Bernardo Scartezini

Ramon Mello tem 25 anos e está lançando seu primeiro livro. Bruna Beber tem 25 anos e está lançando seu segundo livro. O rapaz e a moça escrevem poesia, são poetas. Ambos ganham belos volumes. Bruna & Ramon têm em comum, fora a idade e o bom trato com as palavrinhas, uma decisiva influência da cultura pop. O ouvido de Bruna acolhe o trovador Neil Young e o breguita Benito Di Paula num mesmo universo de referências. Bruna, no livro Balés, mostra ouvido apurado para a melodia dos versos e olhar atento de cronista. O poema Rua da Passagem fica assim: O beijo que espero virá/ da colisão das retas/ paralelas// a caminho da festa/ banho de lama/ na minha melhor roupa// de raspão passará como tiro/ em quem está ao lado/ esperando o ônibus. Ao se saber que ela escreveu esses versos quando morava no Rio e andava de transporte público, s e percebe a herança daquela poesia imediata, cotidiana, de Manuel Bandeira, Mario Quintana e Oswald de Andrade. Também é imediata e urgente a escrita de Ramon Mello em Vinis mofados, acenando, logo de saída, a Caio Fernando Abreu (de Morangos mofados). Tome Segredo para exemplo: Organize a vida/ num pedaço de guardanapo// depois guarde no bolso/ da calça jeans (ellus ou lee)// dizem que angústia/ se perde no vazio dizem. Também fica impresso nas páginas de Ramon & Bruna o espírito aberto da poesia dos anos 1970, 1980 de gente-como-a-gente, como Cacaso e Chacal. Não por acaso a coleção Língua Real, da editora Língua Geral, foi aberta com um poeta daquela geração, Nicolas Behr, nascido em Cuiabá e amadurecido em Brasília. Laranja seleta é uma compilação de poemas antigos e inéditos. Behr está à vontade na companhia de novos e jovens autores. Assim, ele te apresenta esta Laranja: Trinta anos atrás, eu tinha 18 anos. Nunca mais vou ter 18 anos. Nunca mais vou ter o furor de e screver Chá com porrada. O crescimento é inexorável. Mas continuo cheio de dúvidas, cheio de conflitos. Não tenho certeza de nada. As matrizes que permanecem são as da rebeldia. Da não-aceitação de regras prontas para a poesia. Poesia não aceita camisa-de-força. Na poesia vale tudo, até mentir.

Correio Brasilense
Brasília, segunda-feira, 07 de dezembro de 2009

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